domingo, novembro 21, 2021

51 horas







as amizades, mesmo aquelas com mais de quarenta anos, precisam de ser alimentadas, sob pena de também elas não resistirem às agruras do tempo.
conhecedor e respeitador dessa máxima, o albuquerque, lisboeta de gema, manobrou nos bastidores e orquestrou mais um regresso à terra onde foi passar as férias durante décadas, onde ficava na vetusta e hoje serôdia casa das eiras, dos seus avós. não me lembro do preciso momento em que nos conhecemos e começámos a construir essa longa amizade já referida, mas sei que já ultrapassou os quarenta anos.
desde o momento em que ele chegava, até à sua despedida, eu, o albuquerque e o souto, o famoso triunvirato, só não estávamos juntos quando íamos dormir, cada um em sua casa. de resto, naqueles dias em que parecia haver tempo para tudo e os minutos se arrastavam como caracóis ao sol, passávamos os dias a inventar formas novas de passar o tempo. e foram muitas: jogar futebol, ir ao rio, jogar no spectrum zx, ir à boleia a viseu comprar discos, ouvir programas de rádio para gravar em cassete as nossas músicas preferidas, ver televisão e ansiar pelos telediscos dos duran duran, dos a-ha ou dos cock robin, entre muitos outros, jogar futebol de mesa ou grand prix ou até mesmo encetar verdadeiras aventuras quando tentávamos descobrir que segredos escondiam as divisões da casa das eiras que estavam sempre encerradas.
como não poderíamos ficar jovens para sempre, a natural evolução surgiu em forma de casamentos, baptizados e vidas profissionais incompatíveis com o reencontro de três pessoas que habitavam em três locais diferentes do país. mesmo assim, a terra lá ficou - tal como o souto, o único que ainda lá reside -, com as centenas de memórias que lhe agrafámos durante décadas. algo que, enquanto não somos assaltados pelo alzheimer, sabe sempre bem recordar.
foi isso que fizemos no sábado à noite, na citada terra. antes, aqui o lopes foi buscar, com o filho, o albuquerque a nelas, à estação de comboio. padrinho do meu filho, o albuquerque é o mais velho dos três e fez 50 anos há duas semanas. segue-se o souto, em dezembro, e eu, apenas em agosto do próximo ano. e o reencontro também serviu para assinalar esse facto: um de nós chegou aos 50, à meia centena de anos que estaríamos longe de imaginar naquelas preguiçosas tardes em que nos deliciávamos com um gelado e bebíamos green sands, enquanto ouvíamos "the reflex" ou "wild boys", dos duran duran, no walkman.
antes da saída de viseu para nelas, uma desagradável surpresa: um pneu furado no meu carro. contacto para aqui e contacto para ali, a coisa resolveu-se quando uma mão amiga me cedeu as chaves do seu carro. apesar de tudo, chegámos antes do comboio, mas quando chegámos a viseu tínhamos uma empreitada pela frente: mudar o pneu do carro. apesar de todas as peripécias, a coisa ficou feita, embora no dia seguinte de manhã tenha tido de me deslocar a uma empresa da especialidade, recauchutagem, para tratar do pneu furado.
com esse problema resolvido, fomos jantar ao páteo, na rua direita, onde se comeu divinalmente. no final, fomos a uma casa de fados, pinguinhas, mas apenas para beber um digestivo (sem fados, portanto, um registo que nenhum de nós aprecia sobremaneira). o meu filho, o almeida lopes, acompanhou-nos sempre estoicamente e esteve sempre à altura do momento, com o seu irrepreensível sentido de humor. a primeira noite terminou com a sempre indispensável conversa mais séria, já só com o albuquerque, no seu alojamento local (be my guest, altamente recomendado!). teríamos tido conversa até nascer o sol, mas por volta das 3 horas o sono mandou-me para casa (por sorte, apenas a uns 5 minutos a pé).
o sábado começou com a já referida visita à empresa de pneus, recauchutagem viriato, que em apenas 10 minutos me resolveu o problema. depois, reencontro com o albuquerque no nosso "centro de operações" destes três dias: o armazém do caffé, na rua da paz, em viseu. fomos lá umas seis vezes... depois, uma demorada e interessada visita à feira das velharias de viseu, que se realiza no terceiro sábado de cada mês, na rua da paz e na rua formosa. o albuquerque comprou, regateando, claro, como se faz em todas as feiras do género, uma máquina de jogos tipo atari. foi então altura de começarmos a tratar do almoço...
fomos buscar o meu filho a sua casa e, enquanto demos um passeio higiénico pelo parque aquilino ribeiro, decidimos a ementa do almoço: encomendar umas pizzas na pizzaria mytica, a 3 minutos de minha casa, no centro histórico. a minha filha veio ter connosco a casa e almoçámos os quatro, totalmente deliciados com as pizzas confeccionadas em forno de lenha por um chef italiano. depois, nova ida ao armazém do caffé, nova visita à feira, desta vez com a minha filha também, apreciadora deste tipo de eventos, e regresso a casa para ver o watford - manchester united, que os red devils perderam por 4-1, para nosso contentamento.
por volta das 17h00, começámos a organizar a logística da nossa visita à terra do souto, a terra da nossa infância e adolescência. passámos por uma superfície comercial e adquirimos víveres para a nossa "noitada". chegámos às 19h00 e reencontramos o souto no jardim municipal da vila, actualmente em obras. seguimos para o jantar, no restaurante "ela", propriedade de uma simpática trintona polaca, chamada ela faltyn kotygin, sozinha no estabelecimento com o seu filhote de quatro anos, sensivelmente. falámos em inglês com ela, ouvimos boa música e comemos muito bem, com a nossa anfitriã a confeccionar os três pratos que escolhemos, que chegaram à mesa ao mesmo tempo. uma verdadeira multi-tasker!
no final do jantar, uma caminhada nostálgica pelos locais mais emblemáticos da vila, passando pelo café que foi propriedade dos meus pais, pelo campo de futebol do ciclo preparatório, onde fizemos mais de uma centenas de jogos, pelo liceu, pela supra citada casa das eiras, pela escola primária. uma visita guiada pelas nossas memórias e pelas centenas e centenas de recordações que fomos acumulando durante anos. a noite viria a terminar em casa do souto, onde nos fartámos de ouvir música, especialmente do novo álbum dos duran duran, "future past", a nossa banda de eleição durante décadas, mas também com muitas outras bandas que venerámos nos anos 80 e 90. claro que sempre bem acompanhados de um monte dos amigos, vinho alentejano, cerveja heineken e de tudo aquilo que comprámos para aquele reencontro com o nosso amigo. matámos saudades, falámos do passado, comentámos o presente e falámos no futuro, nomeadamente a noite do rock in rio que colocará no mesmo dia os duran duran e os a-ha, outro dos nossos ícones dos anos 80. estamos a congeminar a nossa ida ao festival, apenas nesse dia, para finalmente cumprirmos um dos nossos sonhos de adolescência: ver os duran duran ao vivo! nós que sabemos as letras todas de cor, as músicas, os álbuns, os concertos, enfim, tudo!
despedimo-nos do souto e regressámos a viseu, já de madrugada, satisfeitos por tudo ter corrido bem, incluindo as viagens!
o domingo acordou cansado, fruto de duas noites mal dormidas, mas não foi obstáculo a nada. voltou a iniciar-se no armazém do caffé, onde me encontrei com o albuquerque, de onde seguimos para casa do meu filho. após uma passagem pela pousada de viseu, onde bebemos uns aperitivos, arrancámos para o restaurante onde tínhamos feito reserva: home sushi & asian food, onde nos empanturrámos de sushi, já para não falar no cheesecake de manteiga de amendoim e na tarte de chocolate com raspas de lima. no final, exigia-se uma caminhada, e assim foi. fomos parar à esplanada do irish bar, no centro histórico, onde tomámos café e nos deixamos permanecer um considerável período de tempo, a fazer listas e a estabelecer os "onzes" das nossas preferências futebolísticas. de lá, saímos para minha casa, onde vimos o totthenham - leeds united, novamente com o resultado a agradar aos três.
depois, de volta à estrada, agora para levar o albuquerque a nelas novamente. regressou a lisboa às 19h10, num comboio pontualíssimo, e eu e o meu filho voltámos a viseu. pelo caminho, a confissão de que tinha adorado estes momentos com o pai e o padrinho e o reconhecimento de que já não se ria desta forma há muito tempo. fui levá-lo a casa, abracei-o, também já cheio de saudades dele, porque só o vejo aos fins-de-semana, e vim para casa, para a minha solidão.
cheguei a casa, liguei o computador e escrevi isto...
obrigado a todas as pessoas referidas neste texto por fazerem parte da minha vida!

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