sexta-feira, julho 11, 2008

capítulo V

capítulo V
passaram-se três meses depois da minha saída de casa. continuava em lisboa mas a minha vontade era sair dali. estava a viver em casa do andré, meu colega da repartição. solteiro, 34 anos, o andré era um "bon vivant", uma pessoa que apreciava e perseguia os prazeres da vida, sem dar "cavaco" a ninguém. no trabalho era educado, calmo e ponderado; fora desse ambiente soltava-se completamente e procurava sempre divertir-se ao máximo. não se tratava de um caso de dupla personalidade, mas sim de uma pessoa que sabia perfeitamente separar a vida profissional da vida particular. a minha chegada a casa dele, naquela que seria inicialmente uma breve fase de transição, não alterou em nada o seu modo de viver. apesar de ter um vasto grupo de amigos, passou a ter em mim um parceiro para as saídas nocturnas, para os copos, para as farras e, sobretudo, um "designated driver". o álcool nunca me fascinou muito. via-o sempre como um meio de transporte de um ponto a), um estado normal e racional, para um ponto b), um estado anormal e irracional. nas primeiras saídas nocturnas nunca me conseguia entrosar nos ambientes, em qualquer um deles. e o andré bem tentou diversificar os mesmos. casinos, discotecas, casas particulares, festas na praia, etc.. em todos me sentia deslocado. obviamente, como não apologista das bebidas alcoólicas, o meu estado de espírito ao longo dessas noites era sempre igual. assistia à lenta metamorfose do andré, bebida a bebida, até conseguir chegar ao "ponto g", como ele referia. nessa altura, parava de beber e, simplesmente, deixava o corpo seguir o seu destino. perdi a conta aos "engates" que ele desperdiçou por minha causa. não lhe era muito difícil virar a cabeça a uma mulher. era alto, bem constituído, moreno, cabelo curto e fazia sempre questão de se vestir bem, não descurando pormenor nenhum no seu aspecto. por vezes conseguia ver o "telejornal" inteiro enquanto esperava que ele se arranjasse. quando vinha ter comigo com duas mulheres eu sabia perfeitamente qual era a ideia. invariavelmente, aquela que me estava destinada era sempre substancialmente menos atraente do que a dele. meia dúzia de palavras depois, às vezes nem tanto, vinha o habitual "torcer de nariz", seguido de um ligeiro sussurro ao ouvido da amiga e a consequente explicação para um afastamento. eu não me importava. era evidente que a minha personalidade não se encaixava ali, nem eu tinha alguma predisposição para a moldar àqueles ambientes. limitava-me a observar, noite após noite, a estudar os movimentos, os "joguinhos" de sedução, os truques. nesse aspecto, aprendi muito com o andré, ele sentia-se sempre como peixe na água, seduzia as empregadas com o seu estilo extrovertido e brincalhão. até as piadas menos trabalhadas e nitidamente saloias, quando estava menos inspirado, recebiam rasgados sorrisos, seguidos da famosa passagem das mãos pelos cabelos e leve inclinar da cabeça. para alguém como eu, que sempre tive uma vida pacata e familiar, sem devaneios nocturnos durante largos anos, todo aquele cenário pertencia a um outro mundo alternativo. era tudo novo para mim. lentamente fui aprendendo a "jogar". até me tornar muito bom também...
(continua)

2 comentários:

Anónimo disse...

Por acaso não tens o tlm deste André,não?!Estava interessada...

(Devem ter sido as batatas assadas da D. Rosa que te deram inspiração para tão fascinante personagem!)

Anónimo disse...

A ler:
http://figueirenseporadopcao.blogspot.com/