terça-feira, julho 15, 2008

capítulo VI

capítulo VI
o verão aproximava-se. os dias quentes tinham-se instalado, esticando o dia, aumentando a vontade de sair à rua, de apreciar uma esplanada, com uma gelada cerveja na mão, chinelos nos pés, calções e t'shirt. estar em casa ou no trabalho era uma camisa de forças. o mundo parecia sorrir lá fora, com a habitual agitação urbana transformada em melodias harmoniosas, em ambientes coloridos pelo sol durante o dia, que embelezava mesmo os mais lúgubres recantos de lisboa, e iluminados pela lua de noite, fazendo pulsar as suas artérias mais solitárias. mal acabávamos de jantar, geralmente algo que coubesse no microondas e estivesse ao alcance no congelador, eu e o andré escapávamos para a rua. eu sentia-me um adolescente, a viver as mesmas sensações do meu filho quando o deixávamos sair à noite com os amigos. a convivência diária com o andré tinha alterado muito do meu comportamento social. era inevitável. ele era um especialista na matéria. em termos de bares, cafés, restaurantes e tascas, era muito raro o sítio onde ele não conhecesse alguém. em parte, começava finalmente a sentir-me novamente amparado, a caminhar com o profundo conhecimento de que haveria sempre duas sombras na minha silhueta, fazendo com que os meus níveis de auto-estima começassem a subir. comecei então a sentir que não poderia defraudar a pessoa que me colocou naquele estado, que me tinha aberto todos aqueles horizontes. a forma que eu arranjei de o fazer foi "embarcar" nas suas aventuras, não recusando nada pelo caminho. tinha 40 anos e sentia que ainda não tinha vivido a vida em toda a sua plenitude e, olhando para a vida do andré, era impossível não deixar de sentir alguma inveja. aquilo que no princípio renunciava, quando fui morar com ele, "batia" forte agora como uma premente necessidade.
o meu primeiro grande teste foi numa festa particular em casa de um casal amigo do andré, a paula e o césar cardoso, ele industrial automóvel e ela decoradora de interiores, ambos na casa dos cinquenta anos. a casa era enorme, com vastos relvados, jardins e piscina. mal olhei para ela comecei imediatamente a sentir-me mal vestido. fomos recebidos pelos donos da casa, que cumprimentamos com requintada cortesia, porque o ambiente exigia algum decoro e um comportamento imaculado. rapidamente deixou de se ver o bem tratado relvado da casa, à medida que os restantes convidados iam chegando. césar cardoso sabia receber, agia como um profissional nas suas deambulações pelos vários nichos de gente, cumprimentando, trocando meia dúzia de palavras simpáticas e perguntando sempre se era preciso alguma coisa. facilmente se compreendia nas suas acções o sucesso da sua carreira profissional. a sua esposa era mais comedida, chegando a dar alguns ares de arrogância. foi sempre muito fácil localizá-la durante a noite, constantemente acompanhada por duas amigas numa mesa à beira da piscina.
a noite avançava, assim como o número de copos vazios. a música ia ficando cada vez mais alta nos meus ouvidos. o champanhe escorria desalmadamente pela minha garganta, fazendo aumentar consideravelmente a qualidade da banda. senti então uma vontade incrível de dançar. a banda convidava. parecia mal não aceitar. o andré ainda não tinha tentado o seu habitual truque "eu tenho duas, ficas tu com uma; a mais feia de preferência". desta vez até queria que o fizesse, mas nem sequer o estava a ver. enquanto o procurava, vi o anfitrião encaminhar-se para a garagem com um grupo de pessoas. talvez para mostrar algum carro, porque um bom profissional nunca descansa. o andré já me tinha avisado que ele era assim, viciado no trabalho. por isso tinha tudo aquilo que eu estava a ver, incluindo a paula, sua mulher. ela lá continuava à beira da piscina. aproximei-me lentamente. se eu queria mudar mesmo, teria que começar pelos testes mais difíceis. afinal tinha estado grande parte da noite a olhar para ela. por isso sabia sempre onde ela estava. e o reflexo da água da piscina iluminada na sua cara atribuía-lhe um ar angelical, com olhos meigos e solitários. interrompi educadamente a conversa e convidei-a para dançar. as amigas olharam-me de alto a baixo, com um evidente ar de espanto e indignação. a paula gentilmente recusou o meu pedido, não conseguindo, todavia, deixar transparecer alguma satisfação pelo convite. não querendo parecer mal educado, convidei igualmente as suas amigas de mesa, recebendo a mesma resposta. procurando a melhor saída possível para o meu evidente embaraço, perguntei onde eram as casas de banho. foi a única pergunta que me ocorreu, talvez motivada pelo constante empertigamento da minha bexiga. depois das indicações, afastei-me, roubando mais um copo de champanhe de uma bandeja qualquer. já dentro de casa, errei a porta da casa de banho e dou de caras com o andré, num quarto, aos beijos com uma loura qualquer. nem me viram. fechei a porta devagarinho e, ao virar-me, dou de caras com a paula. tirou-me o copo da mão e disse que me ia indicar onde era a casa de banho. bebeu um pouco de champanhe e seguiu à minha frente, bem devagarinho, soltando os cabelos. o seu corpo ainda virava a cabeça a muitos homens, isso era óbvio. quando vi que tínhamos realmente entrado na casa de banho, não deixei de sentir algum desapontamento, com receio que as suas intenções fossem apenas as de me indicar, mesmo, a casa de banho. mas não eram. fechou a porta à chave, levantou a saia e tirou meticulosamente as suas cuecas. no meu interior, o medo de ser apanhado com a mulher do dono de casa e a excitação de fazer amor depois de tanto tempo travavam uma intensa luta. a fogosidade da paula, a porta trancada, o efeito do champanhe e a minha erecção fizeram a balança pender nitidamente para a excitação. fizemos amor em pé, contra a parede, tentando fazer o menor barulho possível. a intensidade foi tanto maior em virtude do perigo que corríamos de ser apanhados. uniu-nos uma enorme cumplicidade, aliada a uma tremenda sede de afectos e a uma evidente atracção física. no final, depois de nos recompormos, ela saiu primeiro, não sem antes me ter dito que teríamos que repetir um dia.
quando voltei a encontrar o andré, ele estava com duas mulheres... tarde demais.

1 comentário:

Gabriela disse...

onde está o sétimo capítulo? escreva logo, sr. isaac davis. seus leitores aguardam ansiosos, incluindo esta que vos fala.