terça-feira, maio 30, 2006

from a late night train

23h45. chovia intensamente. as luzes da cidade abriam caminho aos seus passos trémulos e inseguros. a custo, olhava para trás, procurando algo que o detivesse. custava-lhe partir, deixar todas as pessoas que amava, sem se poder despedir... e como custam as despedidas!... a espera pelo comboio tornava-se mais amarga à medida que ia aumentando. as dúvidas tomavam agora conta dele, fazendo com que soltasse as mais tímidas lágrimas, que se desintegravam no cimento frio, misturando-se com a chuva. o "confronto" entre os dois cenários pretendidos dilacerava-o, mas tinha noção de que só poderia escolher um deles. na balança estavam as recordações do que já teve e a ansiedade do que poderia vir a ter, caso partisse. o mergulho decidido no desconhecido, na aventura, sobrepor-se-ia ao que construiu durante anos, passando por cima de muitas adversidades? se se conseguisse ver a sua alma nesta altura, ela estaria a sangrar, tal a dimensão das suas incertezas e hesitações.
à medida que a noite ia caindo o frio tornava-se quase insuportável. procurou aquecer-se acendendo um cigarro, procurando conforto numa cadeira, dentro de um estação vazia em tudo, mas sobretudo de calor humano. o comboio estava atrasado. na sua luta interior, o facto de o comboio estar atrasado representava um sinal. tinha mais tempo para evitar tomar a decisão que poderia alterar a sua vida. se a decisão de partir fosse assim tão acertada, porque é que a sua mente continuava a enviar-lhe mensagens de desconfiança e incerteza?
uma voz abrutalhada interrompe-lhe os profundos pensamentos. dentro de momentos, o comboio chegaria à linha. as pernas teimavam em não querer levantar-se da cadeira. os olhos miravam agora o horizonte, aquela curva onde o comboio deveria aparecer, esse adamastor de ferro que lhe exigia uma resposta rápida.
chegou o momento. muitos mais passageiros a sair, a acotovelarem-se no sentido de mais depressa chegarem aos seus lares. para entrar, apenas ele, agora de mãos nos bolsos, amargurado, sozinho, com a alma vazia de tanto sangrar.
alguém lhe tocou no ombro, despertando-o do estado catatónico em que se encontrava há largos minutos. virou-se para trás... e obteve a resposta para as suas dúvidas!...
Ficou...

p.s. - escrito ao som de "From a late night train", dos The Blue Nile.

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