quarta-feira, fevereiro 27, 2008

nó na garganta

hesitei bastante antes de escrever este post. isto porque, apesar de considerar que este blogue tem reflectido, desde a sua criação, muito do que sou como pessoa, a minha personalidade, os meus pensamentos, as minhas paixões culturais, há sempre uma linha de índole pessoal que eu acho que não deve ser ultrapassada. ao mesmo tempo, sinto que se não colocasse neste espaço tudo aquilo que estou a sentir neste momento, estaria a ser desonesto, principalmente comigo mesmo. isto porque desde que este cantinho foi criado é aqui que eu "despejo" a alma e procuro excomungar os meus fantasmas, os meus receios, as minhas ambições e desejos. foi o que aconteceu quando me senti eufórico e feliz; fiz exactamente o mesmo quando me senti triste e depressivo. e volto a fazê-lo hoje. é sintomático que, depois de tantos dias seguidos sem chuva, hoje voltou a chover. curiosamente, começaram a cair os primeiros pingos de chuva quando me despedi dos meus filhos e da minha mulher, quando ela os foi levar à escola. tinha sido a primeira despedida. há um mês que o meu cérebro, sofrendo por antecipação, como é habitual em mim, estava a tentar preparar-se para este dia. nesse aspecto, falhei em grande escala. a expressão máxima desse meu fracasso aconteceu na verdadeira despedida, uma hora e meia depois, quando a chuva já se tinha instalado. e ainda bem, porque assim pude disfarçar melhor as minhas lágrimas. pode parecer a coisa mais lamechas de sempre, mas senti que uma parte importante do que sou como pessoa tinha acabado de ser arrancada. o nó na garganta começou a apertar de tal forma que foi impossível manter a mesma postura da minha mulher. para ela são apenas quatro dias, que vão passar rapidamente. para mim é quase o fim do mundo. ela não sofre por antecipação, nunca mostra sinais de fraqueza, nunca cede sentimentalmente. e ainda bem que ela é assim. estamos nas antípodas em termos sentimentais. foi assim enquanto namorávamos. dez anos em que foi muito raro estarmos na mesma localidade. quando finalmente isso aconteceu, veio rapidamente o casamento. estamos a dois meses de fazer dez anos de casados. dez anos juntos. sempre juntos! e o meu sofrimento agora também passa muito por esse facto: nós estamos sempre juntos. chegamos a passar fins-de-semana inteiros fechados em casa, especialmente quando está mau tempo ou algum dos nossos filhos está adoentado. e a verdade é que nunca chega a ser entediante. para mim, esta é uma prova cabal de como criamos um verdadeiro ambiente familiar, alicerçado em respeito mútuo, carinho, compreensão, ternura, apoio e, não menos importante, divisão salomónica das tarefas domésticas. isto é tão mais importante quando sabemos bem o que custa, a outros casais, estarem até trinta minutos juntos enquanto jantam ou almoçam. a convivência familiar cultiva-se, não se impõe. nesse aspecto, sentimo-nos, os quatro, privilegiados com o que temos, com os laços que criamos. cada momento é gratificante, seja ele um beijo na cara quando eles vão dormir, uma das dezenas de canções que a minha filha canta a toda a hora, um abraço apertado do meu filho quando o ajudo a passar um nível de algum jogo na playstation, ajudar a minha mulher a fazer o almoço e o jantar, dançar com eles, ouvir música com eles, brincar com eles, fazer macacadas para eles se desmancharem a rir (e como é maravilhoso esse som, um autêntico bálsamo), tudo embrulhado com muito amor, porque gostamos mesmo muito de estarmos juntos. e, nos próximos dias, isso não vai ser possível, porque falta uma parte, uma importante e vital parte. sim, ela é verdadeiramente insubstituível, pela capacidade de liderança, pela forte personalidade, pelo domínio absoluto de tudo o que gira à sua volta, pela inteligência e discernimento para escolher sempre as melhores opções, pelo rápido raciocínio quando é necessário resolver algum problema, pelo carinho e ternura que coloca em tudo o que se relaciona com os nossos filhos, pelo grande coração que tem, pela paciência que evidencia em alturas em que o comum dos mortais explodiria de irritação, pela sua sensatez e honestidade, pelo companheirismo, que faz com que, para além de ser minha esposa, também seja uma grande amiga, uma confidente, um apoio, enfim, um rochedo. fico satisfeito por, vinte anos depois, ainda continuarmos com o mesmo brilho nos olhos quando olhamos um para o outro, por saber que, ao contrário de estarmos fartos um do outro, estamos cada vez mais apaixonados, mais unidos e mais solidários.
sim, aquele meu nó na garganta hoje de manhã, quando me despedi da paula, encerrava em si tudo isto. acabo por chegar à conclusão de que, se a nossa vida familiar não fosse tão perfeita, seria muito mais fácil passar por isto agora, nem custava nada. assim, é muito doloroso. para mim, para ela e, principalmente, para eles. eu e o pedro vamos ter que fazer muitas macacadas para distrair a mariana nos próximos dias. vai custar muito, mas os meus filhos merecem que o pai deles esteja à altura desta "missão". e, no sábado, estaremos devidamente preparados para a receber novamente em casa. no nosso "cantinho"! vem depressa!...

3 comentários:

tulipa_negra disse...

que texto mais bonito... realmente nao imaginas o bem que me faz à alma vir aqui ler os teus textos.
verás que a semana vai passar a correr!
custa sempre, mas sobrevive-se!
;-)

bjs e boa sorte com os cachopos

josé alberto lopes disse...

muito obrigado pelas palavras, cara tulipa. às vezes chego a pensar que és a única pessoa a ler este mísero espaço (bem, pelo menos em termos de comentários és de certeza...). agradeço sinceramente a tua fidelidade e presença. quanto ao teu comentário, informo-te que... ja voltou tudo ao normal. a paula esteve fora de quarta-feira a sabado, chegou no sabado às 21h a casa. custou muito mas correu tudo bem, sobretudo porque os meus filhos deram uma verdadeira lição de maturidade. portaram-se lindamente, à excepção da primeira noite, em que a mariana sentiu e de que maneira a falta da mãe. agora já voltou tudo ao normal.
beijos.

Sandra disse...

às vezes também passo por cá... ;)
ao ler o teu post senti exactamente o mesmo que sinto quando estou muito tempo sem o maridinho... porque nós também estamos sempre juntos! nem que seja para isso mesmo: p ficar um fim de semana em casa, sem sair!