terça-feira, fevereiro 22, 2022

qual a minha melhor versão? será que ela existe?





é uma versão, mas uma excelente versão! simon e garfunkel escreveram e lançaram o tema directamente para a história da música. mas esta é uma versão, tal como todos nós somos uma versão. temos estados de espírito moldáveis a todo o tipo de situações.
hoje, tive mais um flagrante exemplo que atesta a última frase. o que era em termos de agonia, miserabilidade e do mais mórbido derrotismo, e no que me transformei, após uma breve consulta de 10 minutos, num ser esfuziante e com menos 300 quilos de preocupações coladas às minhas costas. e, agora, qual destas versões é o verdadeiro "eu"? onde é que me encaixo? sou depressivo, sorumbático e triste, ou sou, ao contrário, extrovertido, expansivo e apalhaçado?
creio que somos aquilo que vivemos. nos últimos seis meses, vivi os mais retorcidos e dilacerantes períodos da minha existência. nunca tinha perdido ninguém muito próximo de mim. perdi. nunca tinha tido graves problemas de saúde. tive-os. nunca tinha sentido um dos meus filhos a fugir-me. senti. nunca tinha visto a minha mãe tão vulnerável. mas vi. no meio de tudo isto, perdi a minha âncora, o maior apoio que tinha. mas, como diz a música, um rochedo não sente dor e uma ilha nunca chora.
agarrei-me ao trabalho, cheguei ainda mais cedo, comecei a sair ainda mais tarde, trabalhei nas folgas, nos fins-de-semana, o que fosse preciso. e quando chegava a casa, à minha infinita solidão, permitia-me pensar cinco minutos em tudo o que se estava a passar comigo. e via tudo negro, um futuro sombrio decorado com as mais refinadas cores de malvadez e crueldade. nessa altura, o tal rochedo transformava-se em finas areias, daquelas que se escapam pelos dedos da nossa ampulheta interior, aquela que marca o tempo que ainda vamos permanecer dentro do nosso corpo.
mas esta versão desaparecia no primeiro minuto do dia seguinte, porque era urgente recomeçar tudo: horários, deadlines, fechos de edição, compras, almoço, jantar, tudo preparado previamente para não se perder tempo. e tudo funcionava, apesar das constantes revoluções de dor provocadas no interior, as tais que não deveria sentir, porque era um rochedo, e os rochedos não sentem dor. mas elas apareciam, não raras vezes, e conspiravam contra a minha mais férrea e determinada vontade de não lhes ligar, tentando afastar o negrume que pairava em cima de mim como luzes de néon a indicar o bar mais próximo numa qualquer avenida frequentada por aqueles que já desistiram da vida.
e assim andei, vários meses, nesta condição de principal opositor das traições do meu próprio cérebro, de super-herói da marvel a utilizar a sua velocidade supersónica para obstruir todo e qualquer pensamento nocivo de chegar às minhas funções motoras.
o que era mesmo importante e vital era continuar, sem olhar a meios. continuar, de sorriso nos lábios. persistir, sem pensar em tudo o que estava a acontecer. és uma ilha, ou não és? és um rochedo, ou não és?
não sei se passei no teste. sei que sobrevivi e que estou aqui. hoje tive excelentes notícias, transformei-me completamente em 10 minutos. agarrei-me ao rochedo. respirei fundo, pensei em tudo o que perdi nestes últimos seis meses, suspirei, disse o que tinha a dizer, por ser a mais elementar verdade, peguei no telemóvel e liguei à minha mãe e aos meus filhos. e fiquei extremamente contente com as reacções que obtive da parte deles!
suspirámos todos de alívio e felicidade. afinal, não sou um rochedo, não sou uma ilha. sou alguém que tem sentimentos, que não tem receio de os demonstrar, seja onde, como e quando for, e que está pronto para enfrentar o resto do tempo que ainda terá pela frente. sejam 10, 20, 30 ou 40 anos, não importa o tempo que for, eu sei que vou tentar ser a melhor versão de mim próprio.
assim a encontre...

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