serei alguma vez capaz de atingir os meus próprios padrões em termos de  personalidade? é complicado estabelecer comparações e juízos de valor  sobre uma pessoa quando verificamos que padecemos dos mesmos defeitos.
a  rita (nome fictício de marta) é intriguista, básica, fútil, hipócrita,  tem mau hálito e um hábito terrível de citar fernando pessoa sempre que  lhe perguntam o que quer de sobremesa. tudo bem, a rita pode ser isto  tudo, mas é fabulosamente agradável em termos visuais.
o rafael  (igualmente nome fictício de marta, curiosamente) deve sentir-se mal por  ser amigo dela? por preferir as virtudes físicas às virtudes morais?  por deixar arrastar uma "amizade" que nada de psicologicamente  estimulante lhe oferece?
se analisarmos estas últimas três pertinentes  questões pelo lado masculino, chegamos à conclusão de que o rafael quer,  efectivamente, apenas "saltar para a cueca" da rita. ou então nem  tanto, tendo em conta o tal problema do mau hálito da rapariga, quer  apenas ser visto com ela, ser invejado pelo resto da sua espécie.
o  rafael criou, durante largos anos, baseando-se em revistas, programas  nocturnos com bolinha vermelha no canto superior direito e na sua  professora de inglês do 8º ano, um consistente ideal de beleza. na sua  transição da adolescência para a vida adulta, conheceu centenas de  mulheres, umas mais inteligentes, outras mais atraentes, sempre com os  mesmos padrões físicos embutidos no cérebro.
depois de uma interminável  travessia pelo deserto (em sentido figurado, claro, porque ele não  conseguiu os mínimos para participar no rally lisboa dakar), rafael  conheceu rita. dois segundos depois, a sua libido deu cambalhotas de  contentamento. dois minutos depois, a libido foi-se deitar novamente,  por manifesto cansaço. meia hora depois, a libido acordou porque alguém  estava a bater à porta, mas era engano. ou seja, o estímulo visual  criado pela rita foi-se desvanecendo com o tempo e o pobre do rafael  começou a ficar dividido.
ouvir horas e horas de conversas fúteis e  insípidas só porque ela é efectivamente uma "brasa" ou continuar a  procurar alguém que reúna as vertentes psicológica e física num só  corpo? pepsi ou coca-cola? fifa 2008 ou pro evolution soccer 2008? conan  0'brien ou jon stewart? miguel sousa tavares ou vasco pulido valente?  pois, o rafael não sabe o que fazer. chega a sentir-se mal ao lado da  rita porque sente que está a atraiçoar os seus próprios valores e  padrões. sente que não é aquilo que ele representa. sente que poderia  perfeitamente estar a ter conversas muito mais interessantes e  estimulantes com outras pessoas, que poderia estar a cultivar-se e a  aprender.
a rita, por sua vez, gosta muito de estar com o rafael, acha  que ele é boa pessoa, com um sentido de humor um bocado esquisito (que  ela muitas vezes não entende mas sorri na mesma para mostrar que  percebeu a piada) e umas referências musicais e cinematográficas  estranhas (cinema europeu? isso existe?). no entanto, ao mesmo tempo  também acha que o rafael é intriguista, básico, fútil, hipócrita, tem  mau hálito e um hábito terrível de assobiar o refrão da música "the  final countdown", dos europe, antes de tomar café.
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