sábado, junho 10, 2023

as recompensas das sextas-feiras...

 


hoje é sexta-feira. em condições normais, teríamos usufruído de duas caipirinhas numa esplanada da cidade, para assinalarmos o final de mais uma dura semana de trabalho. era uma das nossas rotinas, tal como jantar em minha casa nesse dia. trabalhasse ou não nesse dia, já estaria tudo preparado: a ementa do jantar, as entradas, a sobremesa e o vinho, alentejano, sempre. a maior parte das vezes era o nosso vinho, o monte velho. como me sabia bem ouvir-te dizer "este é mesmo o nosso vinho!", tão categórico e firme da tua parte, depois de termos brindado, olhos nos olhos, e de trocarmos um beijo nos lábios. era uma rotina doce, enternecedora e religiosa, que sempre fizemos questão de manter.

era assim que começava o nosso fim de semana. andávamos a semana toda a ansiar pelas 18h00 de sexta-feira, porque era a nossa recompensa por termos trabalhado afincadamente a semana toda, por termos resistido vários dias sem nos vermos, porque às vezes as nossas agendas não o permitiam, e pela ansiedade acumulada. sei que tinhas tanta vontade de me ver como eu a ti, era recíproco. e depois desse momento, o do reencontro, só queríamos estar bem coladinhos um ao outro, como que a desforrarmo-nos de tudo aquilo que perdemos, ou não usufruímos, durante a semana. e era sempre bom, especial e intenso! quando se anseia algo durante vários dias e se chega a esse ponto, o do pleno usufruto do momento desejado, é algo fervilhante, que se quer viver com todas as fibras do corpo.

hoje, voltou a não ser uma dessas sextas-feiras. já são dezenas delas assim, sem ti. sem este nosso cerimonial. sem ansiedade pelo reencontro. sem abrir uma garrafa de vinho tinto alentejano para nós. sem ficar encantado, derretido, embevecido a olhar para ti, bem dentro dos teus olhos, onde conseguia ler tudo aquilo que também me passava pela cabeça. entendíamo-nos assim, por vezes, sem necessidade de recorrer às palavras. bastava o olhar, o toque, a voz meiga e sussurrante, a química que nos envolvia.

chega a ser completamente patético e difícil de entender tudo aquilo por que estou a passar nas últimas semanas. depois de ter sido racional o suficiente para escrever o que escrevi e para, pela primeira vez desde que nos conhecemos, ter assumido uma despedida, encontro-me agora profundamente dilacerado, cortado, rasgado e desmembrado interiormente. de todas as vezes que foi decidido colocar um ponto final, sempre mantive acesa a esperança, porfiei, insisti e não desisti de nós. não foi uma, nem duas, nem três, nem quatro vezes... não me conformei, não me resignei, não abdiquei disto que somos juntos. mas desta vez, e sinto-o de forma cristalina, creio que foi diferente. o meu lado racional falou, é certo, e escreveu o que escreveu, mas no meu lado emocional começou a tocar o sinal de alarme, de perigo, de irreversibilidade...

será que de todas as outras vezes ficou sempre uma luz ao fundo do túnel, de esperança, de uma, ínfima que fosse, possibilidade de revertermos as coisas e recomeçarmos? ficou, claro, caso contrário não teríamos recomeçado. mas agora parece tudo diferente, próximo do inapelável mesmo. e talvez seja por isso que estou assim, há várias semanas: inconsolável, depressivo, amargurado e desgostoso. nunca assumi a ideia de que te poderia perder. apesar de todas as despedidas, ambos sabíamos, como ficou comprovado nos recomeços, de quem éramos, o quanto nos queríamos, o quanto nos amávamos, basicamente. mesmo havendo distância, como agora existe também, nada disso se alterou. eu sabia que tu pensavas em mim, e tu sabias que eu pensava em ti. a cada momento do dia. pois, é o que se passa agora também, mas aqui já só posso falar da minha parte. e é isso que me dói...

dói porque estou, pela primeira vez, creio, com dúvidas em relação a isso. dói porque tenho medo que me tenhas diabolizado tanto ao ponto de me odiares e de nunca mais me quereres ver. dói porque eu nunca quis que isto acabasse, NUNCA, mas o que fica, depois de tudo o que tenho lido, é a ideia de que o grande culpado fui eu, porque tinha um plano b, já andava a arquitectar tudo há muito tempo, e os astros é que tinham razão. nunca menti e detesto injustiças. 

vivia para ti, acordava a pensar em ti, trabalhava a pensar em ti, almoçava a pensar em ti, voltava a trabalhar a pensar em ti, jantava a pensar em ti e adormecia a pensar em ti. estavas sempre presente. não havia, nem podia haver, espaço para mais ninguém. mas isso não era mau, era assim que eu queria. queria saber se tinhas dormido bem, se tinhas almoçado em condições, se já tinhas chegado à formação ou regressado bem a casa. sabia onde estavas, com quem estavas, o que comias, os teus problemas, tudo, tudo, tudo. 

sabia o que te afligia, a forma como procuravas encaixar tudo na tua agenda, como as horas do dia eram insuficientes para tudo aquilo que gostarias de fazer. foi sempre assim até ao final. se tu tinhas horas a menos na tua agenda, eu tinha o meu campo emocional e cerebral totalmente ocupado, sem espaço sequer para uma agulha ou um fio de cabelo. eras tu, tu e tu, 24 horas por dia. precisava da tua mensagem de manhã para começar a trabalhar. precisava de saber se estavas bem. ao almoço, a mesma coisa. quando chegavas a casa. ao jantar. e, ao fim do dia, nunca nos deitávamos sem antes nos despedirmos um do outro. nunca! 

havia tudo nesta relação: respeito, amizade, partilha, cumplicidade, amor, consideração, ternura, carinho, admiração... tudo! portanto, por que raio quereria eu trocar-te por outra pessoa? por que raio estaria eu a congeminar um plano para acabar com tudo isto? por que raio me passaria pela cabeça abandonar a mulher que mais amei em 50 anos de vida, a mulher que mais feliz me fez até hoje, a mulher que me fez acreditar novamente nas pessoas, que me fez sonhar e arquitectar planos em conjunto para o futuro, a mulher/pessoa com quem mais queria estar, pela qual ansiava constantemente, a mulher mais bela que já conheci, a todos os níveis. todos! a mulher que mais desejava! mas teria algum sentido eu alguma vez pensar em deixar-te?! em trocar-te por outra pessoa?!

eu respondo: não teria, não tem, nem teve. e é por isso que é tão injusto tudo isto. eu não acabei contigo. como sabes, nunca o fiz. mas então, por que motivo me sinto assim? que mal fiz eu, afinal? respeitei as tuas últimas palavras, e vou respeitar sempre. sempre fui um cavalheiro, e tu sabes isso também, e nunca faria nada que fosse contra aquilo que me pediste e por isso tenho mantido a distância. não sou de me impor às pessoas, nunca fui, mesmo que isso vá contra todos os meus impulsos. mas o meu respeito por ti e por tudo aquilo que tivemos e temos é maior do que qualquer um dos meus impulsos, por muito fortes que eles sejam. respeito-te demasiado e, por isso, vou continuar a dar-te o espaço que me pediste, sem te procurar. mas, ao mesmo tempo, tenho um enorme receio de, com isso, estar pura e simplesmente a cavar a sepultura desta relação.

conheces-me desde 2011. não sou diabólico. tenho problemas em lidar com os meus sentimentos e por vezes consigo atraiçoar-me a mim mesmo, enveredando por um registo sarcástico que chega a roçar, porventura, algum desprendimento emocional. consigo reconhecer isso. não é arrogância, não é petulância, é um mecanismo de auto-defesa. estúpido, sim, mas um mecanismo. eu sei que já deveria ter mudado neste aspecto. mudei tantas coisas em mim com a tua presença na minha vida, mas ainda não consegui resolver ou evitar este tipo de comportamento. 

não quero que penses que eu deixei de lutar por nós. nunca o farei. hoje, em nossa homenagem, abri uma garrafa de vinho tinto alentejano. não tem piada nenhuma beber sozinho. faltas-me tanto, meu deus! como dói não te ver, não te tocar, não te ouvir, não te sentir...

continuo a acreditar em nós! neste "nós" que construímos juntos. sou e serei sempre teu! nunca te esqueças disso...

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