(artigo publicado no dia 19 de novembro de 2020)
Se é verdade que estamos em guerra, contra um inimigo invisível mas terrivelmente mortífero, devemos analisar as decisões dos denominados líderes que nos representam e a forma como eles se adaptam e reinventam perante as dificuldades. Há vários factores a ter em conta: a forma como comunicam e tentam levantar a moral de um povo assustado, a maneira como empreendem planos de acção contra as adversidades e o seu tempo de reacção perante uma dificuldade pontual.
No dia 12 de Novembro, ficamos a saber que Viseu entrou para o lote dos concelhos com medidas restritivas, daí advindo que durante os próximos dois fins-de-semana, pelo menos, haja recolher obrigatório a partir das 13h00 de sábado e domingo. Como seria de esperar, o sector da restauração insurgiu-se rapidamente contra esta decisão do governo, antecipando avultados prejuízos. O governo respondeu com um pacote de medidas de apoio para o sector, pacote esse que o autarca de Viseu, no dia 13 de Novembro, rapidamente criticou, por considerar manifestamente insuficiente.
Segundo Almeida Henriques, “terá de ser o governo a dialogar com a restauração, que será dos mais afectados com a limitação, sobretudo ao fim-de-semana, e a dialogar com a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal para chegar a um acordo para se encontrar o apoio certo. Se não for 20%, que seja 30% ou 40%, tem de ser aquilo que seja a percentagem adequada que compense o sector. O governo tem de cumprir com o seu papel de contribuir para que menos empresas fechem”.
Do dia 13 de Novembro até hoje, passaram-se seis dias. Compreendendo a preocupação do autarca viseense, que se colocou logo ao lado do sector da restauração, podemos questionar, pegando naqueles critérios todos do primeiro parágrafo, o que é que de palpável ele fez para minorar os prejuízos da restauração no seu território. Basta passar pela página do município de Viseu no Facebook, rever as publicações da última semana e tirar ilações. A tal “dificuldade pontual” apareceu mesmo e os nossos governantes locais tiveram uma semana para empreender planos de acção para a combater e tentar minorar o prejuízo da restauração. Portanto, em termos de tempo de reacção, estamos conversados. Se o governo ofereceu pouco, no entender do autarca local, a sua câmara ofereceu ainda menos. Chutou-se a responsabilidade para o poder central e voltou-se a cruzar os braços, como se o poder local fosse um comando de televisão sem pilhas.
Se quisermos traçar termos de comparação com o que se vai passando no resto do país, até podemos começar com um concelho aqui bem perto de Viseu. A Câmara Municipal de Nelas deliberou, face aos condicionalismos provocados pela pandemia no próximo fim-de-semana, proceder à entrega de refeições take-away dos restaurantes do concelho, através da rede de táxi da vila. A autarquia assume os custos inerente à entrega da refeição, criando uma forma de apoio sector da restauração, um dos mais afectados pelo surto pandémico de covid-19. O serviço é garantido no almoço de sábado e domingo, a partir das 13h00, e ao jantar desses mesmos dias, até às 22h30.
Além desta medida, este município vizinho, na última semana, instalou tendas nas entradas dos Centros de Saúde de Nelas e Canas de Senhorim, para protecção dos utentes, entregou 360 secretárias individuais para os alunos dos agrupamentos de escolas, chegou a um total de 372 cabazes de fruta e produtos hortícolas às famílias mais carenciadas do concelho e negociou com as unidades de saúde familiar locais o alargamento do horário de funcionamento.
Isto foi tudo no mesmo espaço de tempo, ou seja, de 13 de Novembro até hoje. É precisamente quando o cenário começa a ficar bem negro que precisamos dos líderes, das suas tomadas de decisão, determinação, coragem, arrojo e destreza. Para termos mais uma pessoa a criticar as medidas do governo, basta ligarmos a televisão…
Ainda em assuntos relacionados com a pandemia, e fazendo uma ronda pelos restantes concelhos do distrito de Viseu, reparamos que a maior parte deles, na sua página oficial na rede social Facebook, faz um relatório DIÁRIO da situação epidemiológica dos seus territórios, mantendo informados os seus munícipes sobre a dimensão real da pandemia a nível local.
Verificamos que, no mesmo espaço de uma semana, o município de Sernancelhe, em colaboração com as juntas de freguesia do concelho, está AINDA a distribuir máscaras de protecção individual à população local; Mangualde instalou duas tendas nos acessos às unidades de saúde familiar de Mangualde e Terras de Azurara para melhor comodidade dos utentes durante o período de espera e de acesso aos serviços; Cinfães está a comparticipar a administração da vacina da gripe aos cidadãos com 65 ou mais anos de idade e aos grupos de risco; e Tondela anunciou apoios para o pagamento de rendas mensais de estabelecimentos comerciais, serviços e retalho.
Se alargamos o âmbito à escala nacional, e ainda em relação aos apoios específicos para o sector da restauração, vemos Matosinhos a criar um serviço de entrega de refeições ao domicílio, sem custos para o consumidor, para vigorar nos fins-de-semana de recolher obrigatório, Vila Real a abdicar da festa de passagem de ano e a direcionar essa verba para o comércio e restauração, bem como a proceder à distribuição de mil recipientes de alumínio a cada um dos cerca de 50 restaurantes do concelho para serem usados no serviço de ‘take-away’, e Paredes a disponibilizar os serviços de take-away e entregas ao domicílio em aplicação móvel.
Sim, tudo isto se materializou durante a mesma semana, de 13 de Novembro até hoje.
Podemos questionar se a autarquia de Viseu não tem tantos meios à sua disposição como as câmaras de Nelas, Matosinhos, Paredes ou Vila Real. Ou se os autarcas destas localidades estão a favor ou contra o pacote de apoios do governo à restauração. A verdade é que, estando a favor ou contra, colocaram as mãos na massa e tiraram o máximo daqueles dois verbos do primeiro parágrafo, “adaptar” e “reinventar”. Por cá, ainda se continua a conjugar o verbo “ressabiar”… E se não fosse a proliferação de máscaras na rua, ainda se poderia pensar que a pandemia nunca tinha cá chegado.
Em tempo de guerra, as decisões terão necessariamente de ser rápidas, no sentido de ajudar quem mais necessita e não protelar o seu sofrimento. Para a autarquia de Viseu, que apregoa a sua saúde financeira aos quatro ventos, uma semana não bastou para se pensar numa forma de ajudar os proprietários de restaurantes a atenuar os seus prejuízos. Nem um rasgo da equipa que concebeu e executou de forma magistral (segundo eles) o Cubo Mágico, o epítome da criatividade. Enfim, bastava irem à janela, olharem em frente e verem… a praça de táxis.
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