sábado, maio 23, 2009

vicky cristina barcelona






depois de ver "vicky cristina barcelona", e isto deve ter acontecido a muito boa gente, fica-se com uma vontade incrível de ir a espanha, visitar barcelona e oviedo. a fotografia do filme é realmente fantástica, a cargo de javier aguirresarobe, e ambas as cidades são "bem trabalhadas" pela mestria da realização de woody allen. quanto ao resto, o cerne da questão, o argumento gira à volta das avaliações constantes que se fazem durante uma relação amorosa. as personagens representam filosofias românticas totalmente opostas, em que há nitidamente uma ténue linha entre o amor/paixão e o ódio/morte, na relação entre javier bardem e penélope cruz, um cepticismo idealista em relação ao amor que se vai diluindo durante o filme, na surpreendente interpretação da grande revelação do filme, rebecca hall, e uma curiosidade sexual latente e liberal como parte integrante de uma personalidade ainda por moldar e constantemente à procura de novas sensações e emoções, que encontramos na personagem de scarlett johansson. as interpretações, como estamos habituados a ver nos filmes de woody allen, são irrepreensíveis, nomeadamente dos quatro actores citados, dando vida a personagens extremamente bem escritas, minuciosamente trabalhadas em termos psicológicos. não há dúvida que a maria elena (penélope cruz), que só aparece no filme por volta dos 45 minutos, dá um valente "safanão" no filme, transformando uma comédia romântica, quase idílica até aí, num complexo e intenso jogo de sentimentos, dúvidas e ciúmes. as três principais personagens femininas do filme (e ninguém cria personagens femininas tão ricas como woody allen) procuram efectivamente um rumo a dar às suas vidas. johansson (cristina) vê em bardem (juan antonio) o talento que ela sempre perseguiu e sente-se imediatamente atraída por ele e pelo mundo em que ele vive, também à espera de descobrir a sua verdadeira vocação e inspiração; cruz (maria elena) ama loucamente bardem mas não consegue viver com ele, da mesma forma que não consegue viver... sem ele, entrando e saindo da sua vida, cometendo vários excessos pelo meio; e rebecca hall (vicky) (por quem, sinceramente, fiquei "apaixonado" em termos artísticos, chegando mesmo a pensar que o óscar que penélope cruz venceu por este filme deveria ter ido parar às suas mãos) chega a barcelona apenas com a intenção de estudar o mundo catalão, para preparar a sua tese, pensando ter a vida perfeitamente delineada e programada, com casamento marcado, um noivo exemplar e uma carreira profissional definida. porém, o aparecimento de bardem na sua vida faz com que ela descubra um novo conceito, até aí desconhecido: a paixão. javier bardem é o homem que faz "virar" a cabeça a estas três mulheres. é ele que puxa os cordelinhos durante todo o filme, na composição de uma personagem ao mesmo tempo determinada e segura, como vulnerável e vacilante, seguindo os desígnios do seu coração. a inter-relação entre este quarteto é um dos pontos fortes de "vicky cristina barcelona", onde woody allen volta a provar toda a sua perspicácia, acutilância e inteligência na avaliação e observação de relações amorosas.

2 comentários:

  1. não concordo nada com a última frase. gostei do filme e acho que as hipóteses e retratos de relações que passam no filme são do mais puro burlesco. é comédia, exagero, hipérbole, e não fruto de avaliação ou perspicácia das relações homem-mulher. para isso, acho que tens que ir para outros filmes, bem mais antigos.

    abraços
    p

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  2. em nenhuma altura do meu texto tentei estabelecer uma comparação entre os filmes mais recentes de woody allen e os mais antigos. a crítica é quase unânime ao considerar muito mais fraco o trabalho do realizador nos últimos anos, em comparação com os anos 70 e 80. também sou dessa opinião. filmes como "annie hall" e "manhattan" estão a anos luz de qualquer filme que allen tenha realizado nos últimos 10/15 anos. no entanto, apesar de reconhecer o "burlesco" no filme, nomeadamente na personagem de penélope cruz, onde também encaixa o adjectivo "exagero" (e, no entanto, a academia decidiu premiar isso tudo com um óscar), entendo que não deixa de ser perfeitamente visível nas personagens o traço e a marca inconfundível de woody allen (neste aspecto, e talvez por isso eu tenha apreciado sobremaneira a sua actuação, é em rebecca hall que isso se torna mais evidente). quanto às inter-relações entre as personagens, acho um pouco redutor defini-las como o "p" descreveu. comédia há sempre em qualquer filme de woody allen (vá, talvez não em "interiors"); de burlesco temos sempre alguma situação ou personagem; e de relações falhadas está o universo cinematográfico do realizador cheio. num dos meus filmes preferidos de woody allen, "manhattan" (1979), a personagem principal abandona a namorada (mariel hemingway) quando conhece a amante do melhor amigo (diane keaton). depois de uma tentativa de relacionamento, polvilhada com diálogos estimulantes, a mesma personagem acaba por voltar para a namorada, quando se apercebe que as coisas não vão resultar. salvaguardando as devidas distâncias entre os dois filmes, acho que "vicky cristina barcelona" não deixa de se enquadrar, em termos de relações homem-mulher, no referido universo do autor. em "annie hall", alvy singer é completamente apaixonado por annie e, no entanto, ela tem necessidade de "fugir" dele, mudando-se para los angeles, por se sentir "sufocada" por ele. só que, lá está, a obra de woody allen é tão rica, cheia de tantos diálogos memoráveis e de casais cinematográficos inesquecíveis, que o homem, por estes dias, compete contra si próprio.
    abraço.

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