terça-feira, maio 22, 2007

perfeito!


o que pretendemos de um disco? entretenimento? profundidade? algo para distrair os ouvidos? uma base para copos? acho que um disco serve um propósito, quando é realmente ouvido, escutado em toda a sua plenitude: transportar-nos para o universo musical que o grupo pretendeu criar, quando escolheu o alinhamento do mesmo, as letras, as ambiências sonoras… considero que nesta matéria nada deve ser deixado ao acaso. são longos os meses gastos na realização de um disco, na sua planificação, dentro de um estúdio a tentar fazer com que tudo soe o mais perfeito possível. também acho que deverá ser tudo muito mais simples quando se trata apenas de um cantor e uma guitarra ou um piano, sem muitos arranjos sonoros, samples ou atmosferas sonoras electrónicas. a duração do disco também é um factor importante. algures entre o insuportavelmente longo e sem conteúdo, história, rumo ou sentido, e aqueles discos cuja criatividade dos seus autores só deu mesmo para sete ou oito canções, deixando-nos frustrados à espera de mais, está a dose certa, entre as 10 e as 12 músicas, entre os 40 e os 50 minutos de duração.
essencialmente, a um disco novo exige-se durabilidade, muitas horas de audição, sem enjoar, sem anular músicas, saltando de música em música para ouvir apenas as melhores. um bom disco é aquele que se coloca no leitor e se ouve de princípio ao fim, sempre com profundo deleite, tirando o máximo prazer do que se está a ouvir como se fosse a primeira vez, uma novidade. depois, há sempre o teste do tempo. há bons discos que não resistem a esse teste. ouvem-se na altura e arrumam-se na prateleira para lá ficarem a ganhar pó uns anos. a indústria musical está sempre em constante mutação e há sempre algo que fica pelo caminho, uma corrente ou um género musical, os penteados, as roupas, o estilo em palco, as letras, etc. bandas como travis, coldplay, keane, starsailor, walkabouts, doves, the verve, que até se ouviam bem há uns anos, são esquecidas rapidamente e ultrapassadas por algo com maior qualidade e intensidade.

tudo isto para dizer que creio estar na presença de um disco que preenche todos aqueles requisitos que tenho referido para se tornar um "clássico". o meu grau de satisfação tem aumentando gradualmente, como deve ser, em vez de ir diminuindo a cada audição. as referências que se encontram no disco são variadas, desde cocteau twins, velvet indiana, sigur rós, mercury rev, portishead, tudo do melhor quilate musical. o disco tem dez músicas e 43 minutos de duração, ouve-se com prazer renovado, seduz-nos, envolve-nos na delicada voz da vocalista, kazu makino, umas vezes épica, outras sussurrante, apaixonada e ternurenta. apresenta melodias delicadas e pungentes, sem nunca resvalar para o lamechas. o anterior disco deste grupo, "misery is a butterfly", de 2004, parecia impossível de superar em termos de qualidade e beleza musical, até porque foi muito bem recebido pela crítica especializada, chegando inclusivamente uma música do álbum a fazer parte da banda sonora do filme "little miss sunshine". com este novo trabalho, "23", os blonde redhead provaram que não são uma banda que teve uma nesga fortuita de sorte ou um grupo que apenas tinha dez músicas para vender em 2004 quando lhe surgiu a editora 4AD com um contrato na mão. os blonde redhead marcam assim uma posição firme no panorama musical alternativo, com dois trabalhos discográficos refinados e de superior qualidade..
"23" é sublime de tão insaturável que é; é espantoso no conjugar meticuloso de dezenas de sons dispersos que, juntos, criam melodias cativantes, que nos ficam a bailar na cabeça quando não as estamos a ouvir. é daqueles discos que sei perfeitamente que vou ouvir durante muitos anos...

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